domingo, 14 de agosto de 2011

Choramingos?

Domingos tem boa imprensa. Tem, aliás, excelente imprensa. Isso resulta de vários factores:
- o seu passado como futebolista, que lhe transmite uma espécie de honestidade intrínseca (porque os futebolistas são o melhor que há no futebol…);
- a sua ligação ao Futebol Clube do Porto, que motiva a imprensa a extrapolar a qualidade de qualquer pessoal que esteja ligada ao clube, por mais mediana que se possa revelar (após a Supertaça deste ano, um jornalista começava já a chamar a atenção para a possibilidade de Vítor Pereira – que apenas ainda fez um jogo oficial, herdando uma equipa completamente feita e ganhando 2-1 a um Guimarães feito de novo no Verão – ser, mais do que treinador, um «condutor de homens», qual Winston Churchill);
- ter treinado apenas a Académica e o Braga, onde as expectativas nunca excederam as suas capacidades ou das respectivas equipas. (Domingos nunca falhou porque ainda pouco treinou, e porque o fez em ambientes seleccionados). O mesmo se aplica a José Peseiro, Paulo Sérgio, a outro nível Carlos Carvalhal, e outros que, depois, mostraram não ter estofo para estar num clube grande;
- o seu discurso portuguesinho, politicamente correcto, do «somos mais pequenos mas vamos tentar fazer o impossível», que fica sempre bem num jornal quando se tem pouco a perder mas que, num clube como o Sporting, não é suficientemente agressivo;
- ter lidado apenas, desde que começou na Liga profissional, com uma imprensa domesticada, nortenha, de ascendência portista, que faz as perguntas que o clube precisa que se façam e nunca o colocou em situações difíceis, antes o ajudando a passar por elas sem grandes danos para a imagem (a derrota por 5-1 frente ao Porto em 2010, por exemplo, totalmente incaracterística em relação ao percurso do Braga nesse ano, e em que houve um claro sub-rendimento de alguns jogadores e uma amaciamento do discurso de Domingos na semana antecedente, totalmente inversa ao adoptado quando os adversários foi o Benfica).
- os resultados do Braga nos últimos dois anos, que foram uma evolução (acima do esperado, é verdade) do que tinham sido os dos quatro anos anteriores.
O espírito até agora acrítico da imprensa leva a não se dar importância a alguns pontos que se vão revelar durante a estadia de um ou dois anos de Domingos no Sporting:
- Domingos chegou a Braga com uma dinâmica de vitória instalada no clube e uma estrutura organizada. O seu grande mérito foi adaptar-se. O segundo foi fazer um trabalho bem feito, certinho, sem grandes rasgos a nível técnico. Considerando que o Braga evoluiu muito em termos de prospecção e que recebe a protecção do Porto, Domingos não fez, relativamente a outras equipas e outros tempos, muito mais do que treinadores como Cajuda, Manuel José, Marinho Peres, Autuori, Jaime Pacheco e vários outros. No primeiro ano, o Braga beneficiou de uma sequência de bons resultados que provocou uma hipermotivação e permitiu ao clube lutar pelo título até ao fim. No segundo ano o Braga concentrou-se quase completamente nas taças continentais e fez uma excelente Liga Europa, provavelmente irrepetível, seja por Domingos seja por qualquer outro técnico. No Sporting, Domingos vai encontrar uma pressão completamente diferente e vai ter de construir uma equipa praticamente do zero. Uma derrota no Sporting não sofre, nem de longe, o mesmo escrutínio que uma derrota em Braga, nem o conceito de tempo é igual em ambos os clubes, mesmos que os resultados seja, ocasionalmente, coincidentes. A auréola em redor de Domingos vai começar a desaparecer rapidamente, a menos que o Sporting consiga fazer um início de época praticamente perfeito.
- Domingos perde-se em incoerências sobre os árbitros. Para quem ganhou tanto como ele, quer como futebolista quer já como treinador, envolve-se demasiado nas teorias de bastidores e vai acabar por pagar por isso profissionalmente. É demasiado rápido a localizar conspirações e a fazer o discurso do desgraçadinho, a encontrar desculpas nos árbitros e a não reconhecer as vantagens quando estas lhe tocam. Pressiona os árbitros de forma cínica, constante, mas pouco convicta, que passa em branco quando representa uma força não-ameaçadora mas que ganha visibilidade quando o objectivo é defender um Sporting e, por inerência, atacar um Benfica ou um Porto. E isto é relevante, porque Domingos vai ter um jogo difícil de gerir quando defrontar o Porto. Se não for agressivo dirão que não está suficientemente empenhado e que, em Portugal, só poderá treinar o Porto. Se for agressivo perde grande parte da imprensa que o susteve até aqui. Em qualquer uma das situações, a opinião pública atacá-lo-á, e a sua boa imagem, confortavelmente unânime, deixará de ser cristalina. No fundo, Domingos abandonou a sua zona de conforto, quer psicológica quer geográfica. Muito em breve – quando houver decisões controversas de árbitros, por exemplo, ou quando os interesses de Porto e Sporting colidirem – Domingos vai ser confrontado com o seu portismo, especialmente numa altura em que o Sporting tem assumido uma posição de subalternidade em relação ao Porto e em que os seus adeptos se querem ver livre dela.
- Não se vislumbra em Domingos uma personalidade verdadeiramente marcante. Falta-lhe carisma. Chora demais. Tem um discurso antiquado e monocórdico, que não é mobilizador dos adeptos e que, sem o suporte dos resultados, se virará contra ele. Uma fase tão má como a que o Braga atravessou entre Setembro e Novembro do ano passado, por exemplo, ditaria o seu destino em Alvalade. Ainda está por se perceber se Domingos é verdadeiramente um líder que leva os outros a exceder-se ou apenas se beneficiou de ambientes favoráveis e foi um a mais, como tantos outros treinadores noutras ocasiões.
Porque é que Duque e Freitas escolheram Domingos para treinador? Porque, além dos bons resultados acumulados nos últimos dois anos e do sentido ascendente da sua carreira, reúne uma série de vantagens:
- porque conhece o ambiente de um grande clube e isso dar-lhe-á agilidade mediática e tempo;
- porque conhece o campeonato português e isso valerá alguns pontos em relação a um treinador estrangeiro. O Sporting precisa de pontos para deixar de viver nos projectos. Entre os jovens treinadores disponíveis nenhum daria garantias suficientes além dele – só na segunda linha, e a experiência de Paulo Sérgio, por exemplo, foi traumatizante e desmobilizadora;
- para injectar cultura portista no interior do Sporting e, ao mesmo tempo, para estabelecer, de imediato uma clivagem entre o passado recente de subalternização ao Porto e um futuro de desafio à força dominadora, sem o qual Duque e Freitas falharão – porque o verdadeiro desafio, a longo prazo, do Sporting, não é ser melhor que o Benfica mas ser melhor que o Porto;
- para ganhar ao Benfica no imediato, o que é fundamental para que o Sporting ganhe tempo para consolidar a sua equipa e ganhar fôlego financeiro. Mais do que ser campeão no primeiro ano, o que será quase impossível dada a diferença para o Porto, Duque e Freitas pensam em acabar em segundo, ficar à frente do Benfica, receber o balão de oxigénio da Liga dos Campeões, dar um ano de crescimento à equipa e crédito a Domingos, reforçar o plantel e atacar o próximo ano, em que o Porto provavelmente estará menos forte. Um segundo lugar para o Sporting, no actual contexto, com apuramento directo para a Liga dos Campeões, equivaleria a uma óptima época. Domingos tem não só uma aparente vantagem táctica no confronto directo com Jesus como tem o hábito e o prazer de ganhar ao Benfica. A sua abordagem psicológica aos jogos com o Benfica é sempre apurada e estrategicamente perfeita.

1 comentário:

  1. Realmente na "mouche",e isto analisado a 20 de Janeiro,após o debacle dos lacostes no campeonato e Taça da Liga.O Paciências chorou baba e ranho,acusou antigos jogadores seus de serem muito maus para ele e de se ter esborrachado em conferências de imprensa.E depois de ter perdido com o Glorioso.

    ResponderEliminar