sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A treta dos milhões

«Os nossos milhões são a sério, não são milhões da treta»

Pinto da Costa

Falemos, então, das tretas.

O negócio Falcão é um grande triunfo de Pinto da Costa.

Treta. É, quanto muito um triunfo da máquina de propaganda portista. Pinto da Costa não queria vender Falcão, e pensou, genuinamente, que, com a extensão do contrato, poderia guardá-lo pelo menos mais um ano e fazer uma boa Liga dos Campeões esta época. A venda de Falcão, forçada pelo jogador e pelo empresário do jogador a dez dias do encerramento do mercado e a duas semanas do início da referida Liga dos Campeões, e sem alternativas credíveis imediatas no plantel, é uma derrota para o Porto – que, por agora, tem o Kléber, o Djalma e o Walter para jogar à frente, três que (ainda) não fazem um.

O negócio Falcão é um grande negócio

Querem mesmo a verdade? É treta. O negócio Falcão, como o negócio Hulk daqui a um ano, é, na verdade, a pior notícia possível para os adeptos do Porto, porque lhes garante uma verdade indubitável: o Porto ainda não conseguiu dar o salto.

O percurso natural para uma equipa como a do Porto seria a de se estabelecer entre as cinco ou seis melhores da Europa, e como candidata natural, no início de cada ano, pelo menos à presença nas meias-finais da Liga dos Campeões. A qualidade do seu trabalho a isso conduziria. O Porto está no seu ponto civilizacional mais alto. Há alguns anos, com o melhor treinador do Mundo, ganhou a Liga Europa sendo uma das vinte melhores equipas da Europa mas sem ter de jogar contra uma das restantes 19. No ano seguinte ganhou uma Liga dos Campeões vencendo, na meia-final, um Corunha que desceu este ano à II Liga espanhola e a um Mónaco que não é campeão de França vai para vinte (?) anos. Em 2011 voltou a ganhar uma Liga Europa onde não jogam, novamente, as melhores equipas da Europa, batendo na final o quarto classificado do campeonato português, que por sua vez tinha batido o segundo, que ficara a 21 pontos, internamente, do próprio Porto, e ambos eliminados, sem espinhas, da Liga dos Campeões na fase de grupos. Mas, mais de 300 milhões de euros ganhos em transferências (e gastos em transferências) depois, o Porto vê um dos seus jogadores fulcrais facilmente roubado por uma equipa de segunda linha de Espanha, das que «fazem rir».

E assim se vão as esperanças de fazer do Porto uma verdadeira grande equipa europeia. Porque jogadores como Falcão são os que fazem a diferença entre as grandes equipas e as equipas que só dão luta. O que é que o Porto conseguiu com a transferência de Falcão? Recapitulemos:

- trocar um jogador e meio (Falcão e Micael) por nove, o que seria excelente se, nesses nove (praticamente uma equipa inteira, note-se), houvesse, por um lado, um único Falcão, ou alguém que se aproximasse, ou se houvesse, nesses nove, alguém que fizesse a diferença (já para não ir à questão de fazer golos), ou se não pudessem jogar, apenas, onze de cada vez. Na verdade, por mais que os futeboleiros falem da riqueza do plantel, o que faz o verdadeiro sucesso de uma equipa são os seus melhores jogadores. O Manchester United seria banal sem Rooney, por exemplo, e o Barcelona não seria o Barcelona sem Iniesta, Xavi e Messi, por mais equilíbrio que os outros pudessem ter. Um plantel profundo pode ajudar uma equipa a chegar mais longe, sobretudo tendo de jogar tantos jogos importantes ao longo de uma temporada, mas não é a profundidade do plantel que dá, realmente, títulos. Esses, são os grandes jogadores que garantem, e as excepções só confirmam a regra. Sem Hulk e Falcão o Porto não seria o mesmo. Sem Falcão, o Porto não será o mesmo. Nos nove jogadores que o Porto contratou (e falta o substituto de Falcão), não há nenhum para entrar de caras na equipa e elevar o seu valor. É claro que é difícil entrar de caras numa equipa como a do Porto, mas aí é que está a questão. Para ser realmente grande na Europa, o Porto teria de estar, agora, a gastar 43 milhões não a contratar futuros mas a contratar um ou dois jogadores melhores que Souza, ou Fernando, ou Varela, ou Otamendi, ou Fucile, que são bons para o Porto que ganha a Liga Europa mas não são bons para um Real Madrid, um Man. United, ou Chelsea que querem ganhar a Liga dos Campeões.

Para que é que o Porto quer 50 milhões de euros? Para contratar e manter alguém como Falcão. Esse Falcão que vendeu, agora mesmo, ao oitavo classificado da Liga espanhola. E é por isto que a venda de Falcão não é um bom negócio mas sim um retrocesso. O Porto acabará por encontrar outro Falcão? Sim, é verdade, eventualmente sim (até um dia…). Mas quantos 350 milhões de euros mais serão precisos para, quando o encontrar, conseguir fazer uma equipa com ele?

- empacotar a encomenda Micael. E este sim, é um grande negócio, porque, ao contrário do que os propagandistas andam a dizer, Micael não só não tem como não tinha mais mercado que um Carlos Martins ou um Maniche. Como eu tinha dito no último post, assim que li no Record que o Micael tinha mercado e que era, desde há pouco tempo, representado pelo Jorge Mendes, Micael (que, segundo alguns jornalistas, chegou a ser cobiçado pelo próprio Bayern de Munique – como seria giro ver o perna curta do Micael a jogar a meio-campo com o Ribéry, o Schweinsteiger, o Robben…) entra neste negócio metido a martelo pelo Jorge Mendes, que viu aqui uma boa oportunidade para apaziguar a ira do amigo Pinto da Costa, que tanto dinheiro já lhe(s) deu a ganhar, oferecendo-se para o livrar de um saco de lixo ao mesmo tempo que lhe levava o maior tesouro à má fila. Terá sido, mais ou menos, isto que o Mendes disse aos dirigentes do Atlético:

                - Eu trago o homem pelos 38 milhões (mais os meus dois), mas temos de fazer isto com jeito para ninguém se queimar. Vocês pagam agora o Falcão e outro rapaz que eu lá tenho pelo total do valor da cláusula de rescisão do Falcão. O Pinto da Costa pode fazer de conta que fez um grande negócio e ainda arranja uma distracção para levantar a moral às tropas. Metemos o outro rapaz a jogar um ano numa equipa daqui, para ver se ele vai à selecção no Euro da Ucrânia, e daqui a um ano ou vocês ficam com ele ou eu arranjo uns cinco milhões da treta, como arranjei ao meu amigo Vieira para o Roberto, para vocês se verem livre. O rapaz não é mau jogador, até pode ser que pegue.

- E tu consegues meter o rapaz a jogar aqui? Não vamos ficar a arder com a massa e agarrados a mais um salário para pagar durante não sei quantos anos? Olha que isto anda mal, pá.

- Ó pá, fica à minha responsabilidade, palavra de honra. E se não arranjar outro sítio fica mesmo no Saragoça, de que eu agora estou a tomar conta com um amigo. Garanto-te que por menos de cinco milhões o homem não sai, daqui a um ano.

Como é evidente, nenhum jogador suplente do Porto vale cinco milhões de euros – o Fernando, mais um dos que só saem pela cláusula de 30 milhões não vale, para a Roma (que eu continuo a dizer que não existe) sequer, dez, pelo que vinha na Bola de anteontem. Tal como os sete milhões dos objectivos do Falcão (se fossem objectivos viáveis o Porto não teria dúvida em dizer quais eram, para aparecer melhor na fotografia), os cinco milhões do Ruben Micael são da treta. Só que, tal como os 8,6 milhões do Roberto, entram nas contas. Ou, melhor será dizer, na contabilidade criativa.

Uma questão: irá a CMVM suspender as acções do Porto até se compreender o papel do Ruben Micael, comprado para ser imediatamente emprestado ao mesmo clube que não teria dinheiro para comprar o Roberto? Quanto mais não fosse para se perceber exactamente como é que se chega aos tais 5 milhões. É que o Micael ainda paga direitos de formação ao Nacional do amigo Rui Alves, salvo erro…

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