terça-feira, 6 de setembro de 2011

Batalha ibérica

(comentário publicado no blog Bola na Área em 5-9-2011, sob o nickname Especulador Precoce)
A propósito de um jornalista espanhol a meter o bedelho onde não é chamado – desculpem lá mas a minha costela nacionalista tem alguma dificuldade em aceitar este tipo de paternalismos de tipos que, na casa deles, se consomem uns aos outros em ódios clubistas e regionalistas… – duas questões:

1 – Pegando nas palavras muito engenhosas e maquiavélicas, embora correctas, de Jorge Valdano («Mourinho tem um clube e uma equipa ao seu gosto», ou seja, Mourinho ‘amourinhizou’ o maior clube do mundo), qual é a verdadeira relação de poder entre o Real Madrid e Portugal, a eterna província errante de Espanha, o Estado que falta a Castela-Lião (de que o Real é grande estandarte actual) para completar a sua demanda absolutista na Península Ibérica?

É o Real Madrid que está a colonizar Portugal, adquirindo as suas maiores figuras internacionais (há, para o mundo, algum português maior que Ronaldo e Mourinho?) ou é Portugal que está a colonizar o Real Madrid? Quem é que está a absorver quem, Portugal ou Castela-Lião?

Uma vitória do Real Madrid na Liga espanhola e/ou a Liga dos Campeões este ano – e, para mim, é o principal favorito (sim, favorito, acho que o Barcelona vai começar a falhar e que o Real irá aproveitar) – seria uma das mais importantes na sua história, uma vez que é unânime considerar-se esta equipa do Barcelona como a melhor de sempre, a que maior desafio coloca à supremacia histórica do Real.

Este desafio ao castelhanismo agrava-se pelo facto de a Espanha se ter sagrado bicampeã da Europa e do Mundo pela primeira vez graças aos jogadores e à escola do Barcelona, sendo que os jogadores do Barcelona são os primeiros a desprezar o facto de jogarem sob a bandeira espanhola – Piqué, Puyol, Xavi, Busquetes, Valdés, por exemplo, já o demonstraram em muitas ocasiões.

A ideia de que a selecção da Catalunha – o FC Barcelona – facilmente ganharia à selecção do resto de Espanha é aviltante para os «realistas». Que não se duvide que a elevação do Barcelona, bandeira da Catalunha, a superpotência é um momento civilizacional para Espanha, e o Real Madrid é a única esperança dos castelhanos em encontrarem um campeão da sua causa. Ora, a única forma que Florentino Pérez encontrou para ter esperanças de triunfo foi contratando mercenários portugueses.

Se o Real Madrid vencer, este triunfo será, sempre, lembrado como uma vitória dos portugueses acima de todos – deMourinho e de Ronaldo (os outros são meros soldados). Uma vitória de um Real Madrid aportuguesado significaria, de facto, o quê? Uma vitória espanhola ou uma vitória portuguesa, sendo que uma vitória portuguesa, ou catalã, é, fundamentalmente, uma derrota castelhana?



2 – O Benfica passa a contratar jogadores ao Real Madrid e ao Barcelona, com grande êxito, e encontra – graças à intervenção do primeiro português a triunfar realmente em Espanha (Paulo Futre, que pode ser cómico mas tem estrela e tem o condão de estar no sítio certo e de conhecer as pessoas certas) – um clube satélite espanhol para pôr jogadores na montra, num campeonato valorizado (o Granada).

Jorge Mendes, o mais influente empresário do mundo, tem uma jogada visionária ao aproveitar a sua entrada Real Madrid, via Cristiano Ronaldo, para ‘abraçar’ o futebol espanhol. À ‘mourinhização’ do Real corresponde uma ‘mendização’ da liga espanhola. Mendes, neste momento, conseguiu fazer de Sporting de Braga e Atlético de Madrid (dois clubes de top-4 nos respectivos países) parceiros-entrepostos na colocação e valorização de jogadores, não sendo difícil de perceber que, a médio prazo, passará a controlar a qualidade das respectivas equipas através dos jogadores que representa e que lhes cede, se é que não controla já.

Acrescenta, a isto, uma «takeover« hostil, na prática, do Saragoça, um clube histórico e falido que já tornou numa espécie de «equipa do sindicato», onde coloca os jogadores que estão a mais, usando-a para fazer circular «dinheiro da treta» e para manipular o mercado. Mendes já percebeu qual é o futuro.

O futuro é uma liga bipolar (Madrid, Barcelona) ao lado de outra liga bipolar (Benfica, Porto), em que as receitas televisivas provocarão um distanciamento tal entre clubes grandes e clubes pequenos que obrigará à criação de uma «liga proveta» na península Ibérica, uma amostra do que será o futuro do futebol europeu, com a inevitável Euroliga a reunir entre 24 e 30 clubes suficientemente grandes para não perderem dinheiro. Mendes será um dos cientistas malucos  à espera que a «proveta» resulte.

O Benfica dá o salto já em 2013, iniciando o funeral da Sport TV. O Porto vai atrás e, dada a qualidade do seu trabalho em relação a outros que actualmente têm muitos recursos e pouco engenho, poderá, com o aumento de receitas passar a figurar regularmente, de facto, entre as seis melhores equipas europeias. O Sporting acabará por apanhar o barco, porque tem dimensão para isso, apesar de ir atrasado.

E isto, meus amigos, é pura especulação precoce …

2 comentários:

  1. Alguns vaticinios um pouco exagerados. O primeiro, e menos importante, a morte da Sportv. Concorrencia, sim, morte, muito duvidoso.

    Existem imensos entraves a uma liga europeia. O que acontece 'a LC e LE? Como se determina quem entra e quem sai na Liga? Ranking UEFA? Holanda e Russia nao tem ninguem no top-20, por exemplo. As equipas mais fortes de cada Pais simplesmente entram? So nas 7 ligas mais fortes, nos ultimos 10 anos houve 26 campeoes diferentes. Quem fica de fora neste caso?

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  2. Mercado, prestígio, credibilidade...
    Uma mistura de objectividade com subjectividade.
    A forma como se criou o «G-qualquer-coisa» pode dar pistas importantes sobre os critérios de constituição de uma Liga Europeia.
    Uma certeza tenho: o futebol está em expansão,e isso leva a aglomerados cada vez maiores, e não à fragmentação de mercados.
    A «moral» e «ética» desportiva, aqui, serão secundárias.

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