terça-feira, 6 de setembro de 2011

O mercenário

(comentário pulico no blog Bola na Área em 3-9-2011)
A explicação do Ricardo (a que ouvi no rádio, pelo menos) convenceu-me, até porque fica a ideia de que, além do «pormenor» da titularidade, havia, de facto, ali, algum desrespeito. Tem razão quando recorda que outros, até com melhor imprensa do que ele, decidiram sair, enquanto ele ficou para ajudar na transição.

 

Há que entender que, para um jogador como o Ricardo, assim como para outros como Paulo Ferreira, Simão ou Pauleta, a Selecção, nesta fase da sua carreira já não é mais do que, como ele disse, devoção. A nível profissional, o Ricardo (e provavelmente todos os outros, mesmo os mais novos) não voltaria a conseguir uma final de um Europeu e uma meia-final do Mundial (sem esquecer que, na África do Sul, Portugal perdeu apenas por 1-0 com a futura incontestável campeã do mundo e uma equipa que marca uma época). Em jogadores com mais de 30 anos e sobretudo em jogadores como o Ricardo, que jogam, literalmente, ao mais alto nível nos clubes, a selecção é um fardo – um fardo que eles carregam com gosto, mas ainda assim um fardo, física e mentalmente. Jogadores que voluntariamente representam Portugal nestas condições merecem, pelo menos, uma palavra, porque não são, de facto, jogadores iguais aos outros. São jogadores que transmitem valores e que representam, não de uma forma abstracta mas concreta, o ser jogador de Selecção. Os jogadores não são todos iguais, e quem diz que são, engana-se. Por isso é que há campeões e deois há os quenão são campeões.

 

Se o Paulo Bento tivesse ideia de não meter o Ronaldo a jogar de certeza absoluta que lhe diria: «Ronaldo, vais ficar de fora neste jogo. Queres ser convocado à mesma?» De certeza absoluta. (E lá chegaremos, porque o tempo passa para toda a gente) E diria bem, porque o Ronaldo justifica essa atenção. Já não é um miúdo, tem galões, foi à «guerra» por Portugal e ajudou a ganhar-nos muitas e importantes batalhas. Como o Ricardo. O Ricardo não é vaidoso, não é gabarola, não aparece nas revistas a comer as gajas todas, mas também merecia que, antes da convocatória, quando estava a fazer o plano para o jogo com o Chipre e, eventualmente, para o futuro próximo da Selecção (a pensar na fase final do ao que vem) o seleccionador lhe dissesse: «Ricardo, estamos a pensar mudar as coisas mas queremos continuar a contar contigo porque ainda és valioso para nós. Estás disposto a isso?»

 

Se sim, muito bem. Se não, há muitos jogadores com idade e vontade de aprender, e o Ricardo poderia ter a despedida que merecia da Selecção, e não esta canalhice pegada. É uma questão de respeito.

 

Ouvi o Ricardo, muito bem, a dizer que errou na atitude que tomou (e, já agora, a responder a grande altura ao disparate do Paulo Bento). Tem razão. Errou. Foi com a cabeça quente. O Ricardo, apesar de às vezes parecer, não é sobrehumano. Mas o Paulo Bento também não o é de certeza.

 

Gostava muito de ouvir o Paulo Bento, que tomo por convicto e, até, por teimoso, mas não necessariamente por intransigente, a admitir que podia ter conduzido as coisas de maneira diferente, dado o histórico e a personalidade do jogador. Mas gostava, sobretudo, gostava mesmo muito, de ter algum líder (um líder a sério, que não é, nunca foi e nunca será Madaíl, um capacho do poder) a convencê-lo de que essa seria a atitude correcta a tomar. Alguém que não transformasse um mal-entendido, ou um mero choque de personalidades, numa cena vil e suja que faz toda a gente parecer muito pior do que é.

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